top of page

O poder da escolha

  • Isabela Serrano
  • 25 de jun. de 2015
  • 3 min de leitura

“Esse é o pior filme que já assisti”, li ao ver os comentários de um blog que fazia uma breve resenha sobre o filme Birdman. Nos comentários seguintes, encontrar a palavra “bom” era raridade. Enquanto lia, me perguntei por que um filme tão aclamado pelos críticos, vencedor de 4 prêmios do Oscar e de uma criatividade imensa, fora tão desprezado pela grande massa dos internautas que assistiram. A resposta veio do próximo comentário: “O filme é horrível, é puro tédio, não entendi nada”. Então tudo fez sentido. Numa sociedade de efeitos especiais, filmes que exigem uma atenção maior são “puro tédio”, isso devido à “civilização do espetáculo”.


Estamos vivendo em um mundo onde a diversão é supervalorizada, fugir do tédio é uma das preocupações principais entre as pessoas, e o meio usado para esse escape é o entretenimento. Esse fenômeno, segundo Mario Vargas Llosa, é chamado de “civilização do espetáculo”. Essa definição explica o fato de a maioria dos internautas do blog que eu li dizer que o filme é “horrível”. Na verdade, eles não estão desvalorizando os atores, a criatividade, o enredo ou a filmagem, eles estão criticando a falta de efeitos especiais, de bombas explodindo, de adrenalina correndo nas veias, de roteiro fácil de entender.

O fato é que estamos em uma sociedade na qual o que antes era majoritariamente para trazer cultura, conhecimento (música, cinema, literatura, jornalismo, política, arte), agora é feito para trazer divertimento instantâneo. As pessoas estão cansadas de “sofrer de tédio”. Não se sabe mais esperar, é como se essa palavra já não pudesse existir no vocabulário, isso afeta toda uma cultura que tem sido moldada para aderir a essas novas exigências da sociedade. Os livros, as músicas, os vídeos, os programas têm diminuído em cultura e aumentado em piadas, bobagens e distrações. Podemos distinguir nitidamente esse fato pela mudança das músicas brasileiras. Será muito difícil encontrar algum brasileiro que escute Tom Jobim, porém, encontrar um brasileiro que escute músicas que falam sobre “ostentação” será extremamente fácil.

Entendo completamente essa mudança. Não somos educados para entender e apreciar a cultura mais “antiga”, pelo contrário. São exceções as escolas públicas que criam no aluno a motivação pelo estudo dessa cultura. Portanto muitos saem do ensino médio, a desprezando por falta do entendimento. Assim como disse o internauta do blog: ”não entendi nada”. E esse é o ponto.

Num mundo de correrias diárias, é muito mais prático ler uma piada rápida no Twitter, do que parar para ler um trecho de Os Lusíadas, que exige muito mais atenção. Mas a correria e a vontade extrema pelo entretenimento, como Llosa cita, não são os únicos motivos. Um dos principais motivos é a falta de entendimento. Esse é problema: quando o cidadão passa a entender somente e unicamente a cultura do entretenimento, tendo a mente totalmente fechada às outras.

Deveríamos ter o poder da escolha. Deveríamos ler um livro de literatura clássica não somente para fazer uma prova, mas porque conseguimos entender e até mesmo gostar (ou não) dessa literatura. Deveríamos entender um filme que abrange questões mais complexas como Birdman, e só então fundamentar uma opinião. Entretanto, infelizmente muitos ainda não têm esse poder. E os que têm, talvez escolham mais a cultura do entretenimento. Não os julgo. Filmes, livros, músicas que se encaixam à “civilização do espetáculo” também podem transmitir uma mensagem que vá além de entretenimento e futilidade, podem passar uma mensagem cultural profunda e intensa. Também deveríamos ter o direito de escolher a cultura que mais nos agrada. Porém só se escolhe quando se tem mais de uma opção. Neste caso, quando se entende mais de uma opção.


Comments


Destaque
Tags

© por Isabela Serrano. 

  • Facebook B&W
  • Twitter B&W
  • Google+ B&W
bottom of page